Povo gaúcho não consegue retomar rotina após um mês de calamidade
Agência Brasil – A catástrofe climática no Rio Grande do Sul ainda está longe de terminar para o povo gaúcho, que vive agora os efeitos prolongados da devastação causada pelas enchentes e inundações. No dia em que o decreto que reconheceu a calamidade pública um mês, ainda há 37,8 mil pessoas em abrigos e mais de 580 mil fora de casa. Quem conseguiu voltar para casa encontrou um cenário de absoluta destruição e perdas inestimáveis.
A catadora de material reciclável Claudia Rodrigues, 52 anos, que mora na região da Vila Farrapos, zona norte de Porto Alegre, voltou há menos de dois dias para casa. Antes, ela passou quase quatro semanas acampada à beira da rodovia Freeway, que corta a cidade pela zona norte, em uma cena que se tronou comum na região metropolitana. A rua ainda está alagada na altura dos calcanhares, mas dentro de casa a água baixou completamente, revelando um ambiente repleto de lama, ratos mortos, móveis revirados, eletrodomésticos perdidos.
“A dor que eu estou sentindo não tem como explicar, uma mágoa. Olhar para o teu próprio lar e ver um nada. A gente se vê na escuridão. Mas eu creio que vai dar certo e que isso é passageiro, só que até as coisas se ajeitaram é complicado”, desabafa.
Ela só conseguiu voltar para casa porque o terreno tem um desnível e a parte do quarto, que fica acima, não foi alcançada pela água, preservando apenas a cama e o guarda-roupas. Com tanta sujeita e camadas de lama e entulho acumulada, a limpeza deve levar vários dias. Outro problema é o comprometimento da estrutura do imóvel. Claudia notou que as paredes estão com rachaduras e a laje está se soltando. Sem o fogão, destruído pela inundação, ela está dependendo da doação de quentinhas para se alimentar. A energia no bairro só foi religada na manhã deste sábado (1º).
Em Eldorado do Sul, na região metropolitana de Porto Alegre, a autônoma Andressa Pires, 31 anos, mãe solo de três filhos, ainda não conseguiu voltar para casa. Ela vive com os filhos, os irmãos, uma cunhada e os pais em um terreno grande com três casas, no centro da cidade. Eldorado do Sul teve praticamente 100% da área urbana inundada.
“Tá tudo muito úmido em casa, o pátio ainda está sujo e com muita lama para conseguir levar meus pais e as crianças de volta ao lar”, conta. A reportagem da Agência Brasil esteve com Andressa no dia 22 de maio, quando ela estava já no quarto dia de limpeza da casa. Outro problema, segundo ela, é que nem todo o comércio da cidade voltou ao normal, então não há padarias, farmácias nem mercados próximos. Andressa e os familiares fazem parte da estatística das pessoas desalojadas. Eles estão na casa de parentes em Charqueadas, município vizinho.
Vale do Taquari
No Vale do Taquari, que sobreviveu a três enchentes, sendo a do mês passado a pior de todas, o momento ainda é de recuperação do básico. Um dos epicentros da tragédia foi o pequeno município de Muçum, com seus 4,8 mil habitantes. Cerca de 80% da área urbana foi inundada. A prefeitura calcula que vai precisar realocar cerca de 40% dessa área para outros locais seguros contra enchentes e deslizamentos, que também causaram danos e bloqueios de estradas.
“O município de Muçum está no momento ainda de limpeza urbana, de desobstrução de vias e de condições de trafegabilidade, principalmente para o pessoal do interior [zona rural]. A gente destaca que algumas propriedades do interior do município ainda não têm energia elétrica e que o trabalho é intenso para poder devolver essa condição para esses moradores, que é o mínimo que eles podem ter para conseguir restabelecer sua produção. [Aqui] tem muitos produtores de leite que estão, infelizmente, tendo que jogar fora sua produção por falta de condições e também de acesso. E isso tem sido o foco principal do nosso trabalho”, explica o prefeito do município, Mateus Trojan (MDB), em entrevista à Agência Brasil.
Segundo Trojan, a continuidade das chuvas, mesmo após a baixa do Rio Taquari, que chegou a subir mais de 25 metros, acabou prejudicando os esforços de recuperação da infraestrutura.
O Vale do Taquari compreende dezenas de municípios na região central do Rio Grande do Sul, com forte presença da agricultura familiar e uma agroindústria pujante. Um dos desafios é conseguir reter empresas e empregos na região, que começa a sentir os efeitos da devastação. “O processo, agora, é gradativo pela recuperação das empresas, do comércio, do setor primário como um todo. As lavouras foram muito prejudicadas sem os acessos, gerando custos maiores de produção, mas são coisas que também ao longo das semanas a gente vai buscando amenizar os impactos, buscando alternativas de linhas de crédito e de incentivos para que a gente possa reverter essa situação e recuperar todo o nosso setor produtivo”, acrescentou Trojan.
Região Sul
Enquanto a água das inundações no Vale do Taquari e na região metropolitana de Porto Alegre baixaram, na Região Sul do estado os alagamentos ainda persistem. Em Pelotas, por exemplo, cerca de 4 mil moradores da Colônia Z3, uma comunidade de pescadores artesanais às margens da Lagoa dos Patos, estão com as casas inundadas.
“A água estabilizou, não encheu mais, o que é um bom sinal. E começa a baixar. As coisas vão se normalizar, mas vai levar um tempo. Tem muita gente em abrigo, na casa de parentes, cerca de 70% dos moradores desalojados”, estima o presidente do Sindicato dos Pescadores da Colônia Z3, Nilmar Conceição. A preocupação segue sendo uma crise econômica prolongada para o setor pesqueiro de toda a região sul do estado, que abrange municípios como Pelotas, Rio Grande, São José do Norte e São Lourenço, já que a perspectiva dos pescadores artesanais é que a lagoa não renda mais pesca este ano, mesmo após o período do seguro-defeso.
Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil
Agência Brasil – A catástrofe climática no Rio Grande do Sul ainda está longe de terminar para o povo gaúcho, que vive agora os efeitos prolongados da devastação causada pelas enchentes e inundações. No dia em que o decreto que reconheceu a calamidade pública um mês, ainda há 37,8 mil pessoas em abrigos e mais de 580 mil fora de casa. Quem conseguiu voltar para casa encontrou um cenário de absoluta destruição e perdas inestimáveis.
A catadora de material reciclável Claudia Rodrigues, 52 anos, que mora na região da Vila Farrapos, zona norte de Porto Alegre, voltou há menos de dois dias para casa. Antes, ela passou quase quatro semanas acampada à beira da rodovia Freeway, que corta a cidade pela zona norte, em uma cena que se tronou comum na região metropolitana. A rua ainda está alagada na altura dos calcanhares, mas dentro de casa a água baixou completamente, revelando um ambiente repleto de lama, ratos mortos, móveis revirados, eletrodomésticos perdidos.
“A dor que eu estou sentindo não tem como explicar, uma mágoa. Olhar para o teu próprio lar e ver um nada. A gente se vê na escuridão. Mas eu creio que vai dar certo e que isso é passageiro, só que até as coisas se ajeitaram é complicado”, desabafa.
Ela só conseguiu voltar para casa porque o terreno tem um desnível e a parte do quarto, que fica acima, não foi alcançada pela água, preservando apenas a cama e o guarda-roupas. Com tanta sujeita e camadas de lama e entulho acumulada, a limpeza deve levar vários dias. Outro problema é o comprometimento da estrutura do imóvel. Claudia notou que as paredes estão com rachaduras e a laje está se soltando. Sem o fogão, destruído pela inundação, ela está dependendo da doação de quentinhas para se alimentar. A energia no bairro só foi religada na manhã deste sábado (1º).
Em Eldorado do Sul, na região metropolitana de Porto Alegre, a autônoma Andressa Pires, 31 anos, mãe solo de três filhos, ainda não conseguiu voltar para casa. Ela vive com os filhos, os irmãos, uma cunhada e os pais em um terreno grande com três casas, no centro da cidade. Eldorado do Sul teve praticamente 100% da área urbana inundada.
“Tá tudo muito úmido em casa, o pátio ainda está sujo e com muita lama para conseguir levar meus pais e as crianças de volta ao lar”, conta. A reportagem da Agência Brasil esteve com Andressa no dia 22 de maio, quando ela estava já no quarto dia de limpeza da casa. Outro problema, segundo ela, é que nem todo o comércio da cidade voltou ao normal, então não há padarias, farmácias nem mercados próximos. Andressa e os familiares fazem parte da estatística das pessoas desalojadas. Eles estão na casa de parentes em Charqueadas, município vizinho.
Vale do Taquari
No Vale do Taquari, que sobreviveu a três enchentes, sendo a do mês passado a pior de todas, o momento ainda é de recuperação do básico. Um dos epicentros da tragédia foi o pequeno município de Muçum, com seus 4,8 mil habitantes. Cerca de 80% da área urbana foi inundada. A prefeitura calcula que vai precisar realocar cerca de 40% dessa área para outros locais seguros contra enchentes e deslizamentos, que também causaram danos e bloqueios de estradas.
“O município de Muçum está no momento ainda de limpeza urbana, de desobstrução de vias e de condições de trafegabilidade, principalmente para o pessoal do interior [zona rural]. A gente destaca que algumas propriedades do interior do município ainda não têm energia elétrica e que o trabalho é intenso para poder devolver essa condição para esses moradores, que é o mínimo que eles podem ter para conseguir restabelecer sua produção. [Aqui] tem muitos produtores de leite que estão, infelizmente, tendo que jogar fora sua produção por falta de condições e também de acesso. E isso tem sido o foco principal do nosso trabalho”, explica o prefeito do município, Mateus Trojan (MDB), em entrevista à Agência Brasil.
Segundo Trojan, a continuidade das chuvas, mesmo após a baixa do Rio Taquari, que chegou a subir mais de 25 metros, acabou prejudicando os esforços de recuperação da infraestrutura.
O Vale do Taquari compreende dezenas de municípios na região central do Rio Grande do Sul, com forte presença da agricultura familiar e uma agroindústria pujante. Um dos desafios é conseguir reter empresas e empregos na região, que começa a sentir os efeitos da devastação. “O processo, agora, é gradativo pela recuperação das empresas, do comércio, do setor primário como um todo. As lavouras foram muito prejudicadas sem os acessos, gerando custos maiores de produção, mas são coisas que também ao longo das semanas a gente vai buscando amenizar os impactos, buscando alternativas de linhas de crédito e de incentivos para que a gente possa reverter essa situação e recuperar todo o nosso setor produtivo”, acrescentou Trojan.
Região Sul
Enquanto a água das inundações no Vale do Taquari e na região metropolitana de Porto Alegre baixaram, na Região Sul do estado os alagamentos ainda persistem. Em Pelotas, por exemplo, cerca de 4 mil moradores da Colônia Z3, uma comunidade de pescadores artesanais às margens da Lagoa dos Patos, estão com as casas inundadas.
“A água estabilizou, não encheu mais, o que é um bom sinal. E começa a baixar. As coisas vão se normalizar, mas vai levar um tempo. Tem muita gente em abrigo, na casa de parentes, cerca de 70% dos moradores desalojados”, estima o presidente do Sindicato dos Pescadores da Colônia Z3, Nilmar Conceição. A preocupação segue sendo uma crise econômica prolongada para o setor pesqueiro de toda a região sul do estado, que abrange municípios como Pelotas, Rio Grande, São José do Norte e São Lourenço, já que a perspectiva dos pescadores artesanais é que a lagoa não renda mais pesca este ano, mesmo após o período do seguro-defeso.
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